Casca esférica carregada (TA-Fis3) #1
Campo elétrico produzido no interior de uma casca esférica (PARTE 1): como provar que a intensidade do campo elétrico na região é zero?
Este cálculo é facilmente demonstrado por meio da lei de Gauss, mas percebo que muitos alunos não se sentem confortáveis com a resposta dada por esse método. Talvez seja porque a técnica utiliza o conceito de fluxo elétrico, que não é algo muito intuitivo para a maioria dos estudantes, que veem muito mais clareza no resultado obtido por meio da lei de Coulomb. Assim, vamos discutir este assunto utilizando o processo de integração, por mais que isso possa gerar uma caminhada muito mais difícil do ponto de vista algébrico.
Considere uma casca esférica de raio e espessura desprezível, com densidade superficial uniforme de carga
e carga total
. Com este modelo, calcularemos o vetor campo elétrico em um ponto P localizado no eixo
, em uma distância
do ponto O (centro da esfera), conforme apresenta a figura abaixo. Além dos três eixos o sistema cartesiano, a figura também apresenta o eixo w que tem a mesma direção da projeção do vetor
sobre o plano xy.

Figura 1. Casca esférica eletricamente carregada.
Para melhorar a visualização do problema, considere apenas o plano zw apresentado na figura abaixo. O elemento de campo elétrico possui um elemento de carga simétrico, o que permite mostrar que o elemento de campo elétrico resultante
está na direção
.

Figura 2. Plano zw da esfera apresentada na Figura 1.
O vetor distância do elemento de área
até o ponto P é dado por:
(1)
O módulo da equação 1 é dado por:
(2)
Logo, o elemento de campo elétrico é dado por:
em que é constante (condição de existência da casca esférica),
e
:
(3)
Podemos realizar a integração direta da equação 3 em :
(4)
Ambas as integrais da equação 4 são demasiadamente complexas; entretanto, a integral I é zero, pois ela representa a componente do campo elétrico. Você consegue resolvê-la? A integral II pode ser resolvida com um pouco menos de álgebra por meio da substituição
(recomendo a tentativa). Porém, podemos resolver o mesmo problema com menos trabalho por meio do cálculo do potencial elétrico produzido por
em P:
(5)
A equação 5 pode ser resolvida por meio da substituição:
(6)
(7)
Substituindo as equações 6 e 7 em 5, obtemos:
(8)
A equação 8 pode ser escrita no formato modular:
(9)
Os dois módulos da equação 9 significam que estes valores são sempre positivos e para que isso seja verdade fora da esfera, devemos ter . Considerando que a densidade superficial de carga da esfera é
, obtemos:
(10) (
: potencial elétrico fora da esfera)
que é o mesmo potencial elétrico produzido por uma carga pontual. Assim, concluímos que o potencial elétrico produzido fora de um corpo com raio não desprezível é o mesmo do produzido por uma carga pontual. Para dentro da esfera (), a equação 9 é dada por:
(11) (
: potencial elétrico dentro da esfera)
As equações 10 e 11 explicam o comportamento do potencial elétrico para ou
, respectivamente. Em
existe um problema de fronteira e apesar da equação 9 fornecer um resultado coerente, é necessário problematizar um modelo com casca de espessura não desprezível para melhor avaliação do resultado neste ponto (confira essa discussão na PARTE 2). O resultado da equação 11 mostra que o potencial elétrico dentro da casca esférica é constante, i.e., o espaço é equipotencial. Como não existe diferença de potencial entre dois pontos quaisquer, concluímos que o campo elétrico na região é zero, indicando que a soma de todos os elementos de campo no ponto P é nula. Podemos comprovar este resultado por meio do cálculo do campo elétrico a partir da aplicação do operador gradiente [1, 2]:
Considerando a coordenada na direção radial, obtemos:
(12) (
: campo elétrico fora da esfera)
(13) (
: campo elétrico dentro da esfera)
mostrando que o campo elétrico produzido dentro da casca é nulo, i.e., os vetores se anulam em qualquer ponto da região. O comportamento gráfico das equações 10, 11, 12 e 13 são apresentados na figura abaixo. Para isso, considerei uma esfera com raio de 1 cm e V
cm.
Referências
[1] NUSSENZVEIG, H. M. Curso de Física Básica 3: Eletromagnetismo. 1. ed. São Paulo: Edgard Blucher, 1997.
[2] DUARTE, D. A., Videoaula: Campo elétrico obtido pelo potencial.
Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=qAOnJgU9C70&t=4700s.